Fethullah Gülen, mestre do humanismo e do entendimento multicultural
Marli Barros Dias - Colaboradora Voluntária Sênior Nascido em 27 de abril de 1941, em Erzurum, na Turquia, no seio de uma família humilde, filho de um Imã e de uma professora voluntária de Alcorão, Fethullan Gülen aprendeu, desde cedo, os princípios do humanismo que alimentaram a sua infância e juventude tornando-o, na atualidade, num dos pioneiros do discurso intercultural e inter-religioso, no seu país e no mundo. Formado em Ciências Islâmicas, Gülen é, além de professor, teólogo, literato, escritor, poeta, líder de opinião e erudito islâmico, um destacado ativista pela Educação e defensor da paz em nossos tempos. Enquanto promotor dos valores espirituais, por meio da Educação e do diálogo, o líder turco tem trilhado um caminho que, para os seus seguidores e, também, para aqueles que trabalham em prol das causas humanitárias, constitui um modelo que inspira a prática cotidiana. Porém, o pensamento de Gülen, que não está apenas no plano das ideias, tem provocado o combate por parte daqueles que rejeitam a igualdade de direitos entre as pessoas e os princípios da Democracia. Em 1971, na sequência de um Golpe de Estado na Turquia, Fethullah Gülen foi preso permanecendo encarcerado durante seis meses sem acusação. A reprimenda aplicada ao líder humanista não foi suficientemente capaz de interromper a sua obra que continuou e se expandiu desde a criação do Movimento Gülen, ou Hizmet (Serviço), de caráter cívico-social, idealizado por ele em finais dos anos de 1960, na Turquia. O Hizmet tem como alicerce da sua existência o compromisso com a Educação, o diálogo, a paz, a justiça e a harmonia social. Este movimento traduz, na prática, as ideias de seu fundador, isto é, de que é possível alterar positivamente uma sociedade. Segundo Fethullah Gülen, “o Hizmet surgiu com a ideia de fundar instituições educacionais para formar jovens virtuosos, a fim de tentar encontrar soluções para os problemas do país”. Numa época em que muitas famílias na Turquia, com poucas condições econômicas, não tinham muitas opções para conseguirem manter os seus filhos no Ensino Médio ou na Universidade nas grandes cidades, num ambiente propício para a formação dos jovens, Fethullah Gülen mudou esta realidade, através da criação de bolsas de estudo e de alojamentos para estudantes financiados pelas comunidades locais. O Hizmet, de fato, foi e continua a ser para muitos a crença no futuro a partir de uma Educação laica e com valores centrados no ser humano independentemente de confissão religiosa. Hoje, o movimento é transnacional e está presente em mais de 170 países, devolvendo a esperança de vida digna a milhares de pessoas. Os seus voluntários são “estudantes, acadêmicos, empresários, profissionais liberais, funcionários públicos, agricultores, homens e mulheres, jovens e velhos” que “contribuem para múltiplas formas de serviços, que se concentram em centros de ensino, escolas, faculdades, hospitais, organização de ajuda humanitária, editoras e instituições de mídia, tanto na Turquia”, quanto ao redor do mundo. O trabalho desenvolvido por Fethullah Gülen, digno de distinção e que culminou no Hizmet, enfrenta na atualidade a oposição do Presidente turco, Recep Tayyip Erdoğan, para quem o movimento é “um Estado paralelo” e uma “organização terrorista”. Gülen encontra-se auto-exilado nos EUA desde 1999, quando viajou àquele país para que lhe fossem prestados cuidados médicos. No Estado da Pensilvânia, onde estabeleceu residência, o erudito turco vive em um retiro “com um grupo de estudantes e médicos” e dedica-se “à leitura, escrita, ensino, oração individual e em pequenos grupos, e recebe alguns visitantes, quando sua saúde permite”. Embora distante da Turquia, ele enfrenta diversas acusações por parte do Governo turco, que tenta criminalizá-lo, tal como o Hizmet, embora nunca tenha conseguido provar envolvimento, quer de Gülen, quer do movimento que ele lidera, em nenhum crime. Mas a ausência de provas não serviu para impedir que a Procuradoria turca pedisse duas “condenações perpétuas e uma pena adicional de 1.900 anos” de prisão para ele. Gülen foi acusado de ter orquestrado o Golpe de Estado falhado de 15 de julho deste ano (2016), assim como de tentar “destruir a ordem constitucional pela força” e, também, “de formar e conduzir grupos terroristas armados”. No entanto, ele nega todas as acusações, condenando qualquer ato de violência. Em 19 de dezembro, o assassinato a tiros do Embaixador russo na Turquia, Andrei Kharlov, durante a inauguração de uma exposição de fotografias, em uma galeria de Arte em Ancara, por um jovem ex-policialturco de 22 anos, de nome Mevlut Mert Altintas, fez com que, imediatamente, Erdoğan atribuísse a responsabilidade do crime a Fethullah Gülen. Porém, o grupo insurgente Jaysh al-Fateh, que integra a Frente da Conquista do Levante – a antiga Frente al-Nusra – assumiu a autoria do atentado que, mais tarde, foi reivindicado pelo Estado Islâmico. A frase proferida pelo assassino antes de ser morto pela polícia, em que disse: “nós morremos em Aleppo, você morre aqui”, revela que os radicais agiram em retaliação ao apoio russo ao regime de Bashar al-Assad, na guerra na Síria e, ao mesmo tempo, inocenta Fethullah Gülen, que condenou o trágico episódio que levou a óbito o Embaixador russo. Em declaração escrita, Gülen afirmou: “Eu condeno veementemente este ato hediondo de terrorismo”. Segundo informações, há indícios de que há radicais infiltrados nas forças policiais turcas, depois que “milhares de policiais foram expurgados por suas supostas ligações com o movimento Gülen”. Neste contexto, em várias ocasiões, o líder humanista Fethullah Gülen foi responsabilizado pelo Governo turco por ações levadas a cabo contra o país. Até hoje, nada se conseguiu provar, mas ante as incertezas regionais e internacionais torna-se necessário refletirmos sobre a segurança deste ser humano que persiste na defesa de valores humanísticos a partir do acolhimento e da prática enraizados no princípio do entendimento intercultural e inter-religioso que, muitas vezes, são condenados por indivíduos cuja visão estreita da realidade não concebe a liberdade e a igualdade entre os seres humanos como um direito inalienável. |