Progresso Vicioso e Virtuoso
Este artigo do Senador Cristovam Buarque foi publicado em inglês no jornal Today's Zaman na Turquia. Durante a viagem à Turquia organizada pelo CCBT, Senador Cristovam tinha visitado o Jornal e recebido pedido de um artigo. Quando olhamos ao redor, é impossível não nos surpreendermos com os resultados que o progresso trouxe para a humanidade. Graças ao avanço técnico e científico conseguimos aumentar a esperança e a qualidade da vida, vivemos mais tempo, com mais saúde e conforto. A humanidade adquiriu a riqueza de US$ 80 trilhões anuais; as artes, as filosofias, assim como as ciências deixaram os homens mais deslumbrados com a beleza e com a verdade; e dispondo de bens que lhes ajudam a enfrentar as adversidades naturais e sociais. É como se estivéssemos coroando o progresso econômico. Mas, ao olharmos com mais rigor, vemos que o progresso também nos trouxe consequências trágicas. Mais grave ainda: as tragédias do progresso decorrem da própria lógica do progresso. Como erros vindos dos acertos, fracasso graças ao êxito. Os melhores exemplos são o desastre ecológico como resultado do sucesso do avanço técnico e da economia; a desigualdade no acesso à saúde como produto da modernidade dos produtos médicos; a globalização fazendo ser fácil cruzar os oceanos e difícil atravessar ruas de algumas cidades. Foi o progresso que trouxe as virtudes da modernidade, mas estas virtudes foram criadas por uma modernidade movida por vícios sociais que não estão sendo estancados por valores éticos. Para produzir as virtudes do progresso, foi necessário viciar o progresso. Os resultados dos vícios são tão visíveis quanto as virtudes, mas tomam mais tempo para serem percebidos. A humanidade se viciou em um tipo de progresso na sua relação com a natureza e nas relações humanas, como um dependente de drogas que se suicida sem perceber, ou aquele rei incapaz de controlar a ganância, mesmo sabendo que se afogará no ouro produzido por tudo em que toca. Ao olhar ao redor, vemos que o progresso nos trouxe a destruição ambiental provocada pelo vício no aumento do consumo; ampliou a desigualdade no acesso aos benefícios do avanço técnico; fortaleceu a materialidade sobre a espiritualidade e a cultura. Écomo se o êxito do progresso provocasse seu fracasso, a humanidade viciada no progresso que não consegue parar. Para realizá-lo caminha para o desastre, como um viciado em drogas leva sua vida. Neste começo do século XXI, a humanidade parece caminhar para seu êxito e seu fracasso, capaz de produzir imensas riquezas, sem saber parar antes de ser destruída por ela. Diante da humanidade há dois caminhos: seguir em frente com o vício ao progresso, na direção do desastre ecológico do aquecimento global até a destruição do equilíbrio ecológico que sustém a vida; ou reorientar o progresso em direção a uma modernidade controlada por valores éticos, levando a um progresso virtuoso. O novo progresso, virtuoso, precisará definir metas que submeterão o crescimento econômico a valores éticos. Em primeiro lugar, o respeito à base natural da vida e seu patrimônio. A própria definição de progresso deve incorporar entre seus objetivos um equilíbrio ecológico necessário à sobrevivência da humanidade e à garantia de seu patrimônio natural. Em segundo lugar, a subordinação do avanço técnico de maneira a não ser usado para benefício de alguns, excluindo outros, especialmente nos aspectos relacionados à saúde e a educação. Em terceiro lugar, a garantia de que o progresso eliminará a exclusão social, oferecendo o mínimo necessário à sobrevivência de cada pessoa. Em quarto lugar, oferecendo a todas as pessoas, desde a infância, a chance do pleno desenvolvimento de seu talento, por meio de educação de qualidade para todos. Esta condição do progresso virtuoso é a base dele próprio, na medida em que o progresso deve ser cada vez mais identificado com a ampliação do patrimônio cultural da humanidade. Em quinto lugar, o respeito à liberdade individual, dentro dos limites da liberdade das demais pessoas. Em sexto lugar, a garantia de paz, abolindo a abominável lógica de considerar como progresso o crescimento econômico graças a guerras earmas. Em sétimo, uma mudança intelectual capaz de redefinir progresso como um propósito libertário, sustentável, enriquecedor culturalmente. Esta condição do progresso vicioso é a que mais dificuldades apresenta. Porque a humanidade está viciada no progresso do crescimento econômico e seu consequente consumo; ou está viciada no consumo e no seu consequente crescimento econômico. No lugar do crescimento econômico, a meta do avanço social; no lugar do equilíbrio econômico de curto prazo, a harmonia constante entre os seres humanos e deles com a natureza. Artigo foi publicado no jornal Today's Zaman: |